quinta-feira, 25 de abril de 2013

O que é Filosofia, na obra O Mundo de Sofia



Muitas pessoas têm hobbies diferentes. Algumas colecionam moedas e selos antigos, outras gostam de trabalhos manuais, outras dedicam quase todo o seu tempo livre a uma determinada modalidade de esportes.
Também há os que gostam de ler. Mas os tipos de leitura também são muito diferentes. Alguns lêem ape­nas jornais ou gibis, outros gostam de romances, outros ainda preferem livros sobre temas diversos como astro­nomia, a vida dos animais ou as novas descobertas da tecnologia.
Se me interesso por cavalos ou pedras preciosas, não posso querer que outros tenham o mesmo interesse. Se fico grudado na televisão assistindo a todas as transmissões de esporte, tenho que aceitar que outras pessoas achem o esporte uma chatice.
Mas, será que existe alguma coisa que interessa a todos? Será que existe alguma coisa que concerne a todos, não importando quem são e onde se encontram? Existem questões que deveriam interessar a todas as pessoas.
Qual a coisa mais importante da vida? Se fazemos esta pergunta a uma pessoa de um país assolado pela fome, a resposta será: a comida. Se fazemos esta per­gunta a quem está morrendo de frio, então a resposta será o calor. E quando perguntamos a alguém que se sente sozinho e isolado, então certamente a resposta será: a companhia de outras pessoas.
Mas, uma vez satisfeitas todas essas necessidades, será que ainda resta alguma coisa de que todo mundo precise? Os filósofos acham que sim. Eles acham, que o ser humano não vive apenas de pão. É claro que todo mundo precisa comer. E precisa também de amor e cuidado. Mas ainda há uma coisa de que todos nós pre­cisamos. 1 Nós temos a necessidade de descobrir quem somos e porque vivemos.
Portanto, interessar-se em saber porque vivemos não é um interesse casual; como colecionar selos, por exemplo. Quem se interessa por tais questões toca um problema que vem sendo discutido pelo homem prati­camente desde quando passamos a habitar este planeta. A questão de saber como surgiu o Universo, a Terra e a vida por aqui é uma questão maior e mais importante do que saber quem ganhou mais medalhas de ouro nos últimos Jogos Olímpicos.
2 O melhor meio de se aproximar da filosofia é fazer perguntas filosóficas:
Como o mundo foi criado? Será que existe uma vontade ou um sentido por detrás do que ocorre? Há vida depois da morte? Como podemos responder a es­tas perguntas? E principalmente: como devemos viver.
Estas perguntas têm sido feitas pelas pessoas de todas as épocas. Não conhecemos nenhuma cultura que não se tenha perguntado quem é o ser humano e de onde veio o mundo.
Basicamente não há muitas perguntas filosóficas para se fazer. Já fizemos algumas das mais importan­tes. Mas a história nos mostra diferentes respostas para cada uma dessas perguntas que estamos fazendo.
É mais fácil, portanto, fazer perguntas filosóficas do que respondê-las.
Da mesma forma, hoje em dia 3 cada um de nós deve encontrar a sua resposta para estas perguntasNão dá para procurar numa enciclopédia se existe um Deus, ou se há vida após a morte. A enciclopédia tam­bém não nos diz como devemos viver. Mas a leitura do que outras pessoas pensaram pode nos ser útil quando precisamos construir nossa própria imagem do mundo e da vida.
A busca dos filósofos pela verdade pode ser com­parada com uma história policial. Um crime na vida real pode chegar a ser desvendado pela polícia um dia. Mas também podemos imaginar que a polícia nunca consiga solucionar determinado caso, embora a solução para ele esteja em algum lugar.
Mesmo que seja difícil responder a uma pergunta, isto não significa que ela não tenha uma – e só uma – resposta certa. Ou há algum tipo de vida depois da morte ou não.
Muitos dos antigos enigmas foram resolvidos pela ciência ao longo dos anos. Antigamente, um grande enigma era saber como era o lado escuro da lua. Não era possível chegar a uma resposta apenas através da discussão; a resposta ficava para a imaginação de cada um. Hoje porém, sabemos exatamente como é o lado escuro da lua. Não dá mais para acreditar que há um homem morando na lua, nem que ela é um grande queijo, todo cheio de buracos.
Um dos antigos filósofos gregos, que viveu há mais de dois mil anos, acreditava que 4 a filosofia era fruto da capacidade do homem de se admirar com as coisas. Ele achava que para o homem a vida é algo tão singular que as perguntas filosóficas surgem como que espontaneamente. É como o que ocorre quando assistimos a um truque de mágica: não conseguimos entender como é possível acontecer aquilo que estamos vendo diante dos nossos olhos. E então, depois de as­sistirmos à apresentação, nos perguntamos: como é que o mágico conseguiu transformar dois lenços de seda brancos num coelhinho vivo?
Para muitas pessoas, o mundo é tão incompreensí­vel, quanto o coelhinho que um mágico tira de uma cartola, que há poucos instantes estava vazia.
No caso do coelhinho, sabemos perfeitamente que o mágico nos iludiu. Quando falamos sobre o mundo, as coisas são um pouco diferentes. Sabemos que o mundo não é mentira ou ilusão, pois estamos vivendo nele, somos parte dele. No fundo, somos o coelhinho branco que é tirado da cartola. A única diferença entre nós e o coelhinho branco é que o coelhinho branco não sabe que está participando de um truque de mágica. Conosco é diferente. Sabemos que estamos fazendo parte de algo misterioso e gostaríamos de poder expli­car como tudo funciona.

GAARDER, Jostein. O Mundo de Sofia Cia das Le­tras.1995.


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